sábado, 12 de janeiro de 2013

Chicletes Gorila um sabor de Amizade


 
Olá, quem não se lembra das pastilhas elásticas Gorila!
Eu aproveitava todos os trocos e gorjas, que tinha como recompensa dos recados que fazia a algumas velhotas, da minha aldeia,
Para comprar as chiclas da Gorila.
Era dois em um. Já que para além da pastilha, ela fazia-se acompanhar de um cromo para juntar a nossa coleção.
Este investimento saciava dois desejos.
Sempre que ia a loja do Sr., António com algumas moedas a reluzirem na minha mão, ele já sabia.

Quantas são menino?

Deixava cair as moedas em cima do balcão e juntos conferia-mos, para ver quantas dava.
Por vezes até faltavam uns testões, mas o Sr. António que não era somítico, acabava por me presentear com mais uma.
Aquela atitude era como me fidelizar-me a sua loja.
Era uma figura pitoresca, de estatura média, magro e com um longo e farfalhudo bigode.
Tinha um semblante sorridente e sempre por companhia o seu lápis por de traz da orelha.
Sentia que gostava de mim, só não achava muita piada a algumas das traquinices que por vezes fazia em conjunto com os outros.
Ainda recordo a célebre frase que as pessoas mais velhas da minha aldeia diziam.

Raios parta a canalha,
Nem o diabo quis conversa com ela.

Eu não achava piada a frase porque se o diabo é tão mau,
Então estavam a dizer que nós ainda eramos piores.
Mas ao mesmo tempo também lhe dava outra interpretação.
Se nós conseguíamos ser piores que o diabo, que é mau, ainda somos mais fortes, era-mos uns heróis.
Com as Gorilas no bolso eu era um rei.
Os meus amigos acercavam-se de mim na ânsia que eu lhes oferecesse uma chicla.
O Daniel o Rafa o Rodrigo o André quase que em uníssono uns com voz mais audível outros mais tímida, pediam-me.

Ó, Diogo podias dar-me uma chicla.
Dás-me Diogo? Anda lá!

Eu acedia ao pedido, mas com uma condição.
O cromo, é meu.
A quem eu oferecia em primeiro era ao Rodrigo, porque era o mais tímido e nem pedia.
E como fui educado a não pedir nada aos meus pais, sabendo eu que dessa forma lhes despertava uma maior vontade de me presentear,
Achava a postura do Ródri era assim que o tratava, mais correta.
Ele bem sabia que eu nunca me esquecia.
Era um bom e grande amigo, daqueles que se gosta muito de ter.
Por vezes até nem lhe dava na frente dos outros, para eles não repararem na minha dualidade de critérios.
Mas o Ródri sabia que eu tinha sempre a pastilha para ele.
E com uma vantagem, eu dava-lhe o cromo se ele já me fosse repetido.
Uma vez fui chamado a pressa pela minha mãe.
Corri para casa e acabei por me esquecer de dar a chicla ao Rodrigo.
Lembrei-me durante o jantar.
Fiquei triste por me ter esquecido.
Arranjei uma boa mentira para os meus Pais me deixarem ir a casa dele.
Inventei algo sobre um trabalho de turma que estava-mos a fazer na escola, e que tinha-mos de dar continuidade em casa.
A minha Mãe disse-me logo que não, faltava o veredito final do meu Pai.
Vais, mas quero-te aqui em casa dentro de 15 minutos.
Respirei de alívio, era tempo mais que suficiente para dar uma fugida a casa do Ródri.
Saí porta fora a correr.
Toquei a campainha.
Vinha lá de dentro um fervilhar de vozes alteradas, pareciam discutir.
Fiquei algo assustado.
O Pai do Ródri não ia lá muito com a minha cara, porque eu era muito frontal e rebatia as ideias ditatoriais dele.
Bom, eis que alguém abre a porta, fiquei algo receoso, mas era o Rodrigo.

O que queres?

Senti que ele estava magoado comigo.
Pedi-lhe desculpa e estiquei-lhe a mão e entreguei-lhe a gorila.
Instantaneamente o semblante carregado, deu lugar a uns olhos rasos de lágrimas.
Agradeceu-me com a voz trémula.

Não tinhas necessidade de vires cá.
Muito obrigado, és um grande amigo Diogo.
Nunca tive dúvidas disso.
A, e desculpa a maneira como te falei quando te abri a porta.
Como já deves ter dado conta as coisas aqui por casa não estão fáceis.

Sim, já deu para ver.
Ródri, se a gorila ajudar a ficares um pouco mais feliz, já fico contente.

Não, Diogo. A chicla não me vai por feliz.
Mas o teu gesto a tua atitude, essa sim encheu o meu coração de felicidade.

Ainda bem Rodrigo.
Boa noite.

Mais uma vez obrigado Diogo.
Amanhã dou-te o cromo.

Não, é para ti.

E se te faltar?

Ródri, não é um cromo que paga a felicidade de um amigo.
Tchau, fica bem.
Corri para casa já que o tempo que me tinha sido concedido pelo meu Pai estava-se a esgotar.
Chegado encontrei o meu pai a ler, e a minha mãe a preparar as roupas para o dia seguinte.
Olharam-me, e a minha mãe fez o comentário.

Então Diogo o trabalho, já tiraste as dúvidas com o Rodrigo?

Sim, mãe já.

Diogo, sabes que nós não gostamos que tu mintas, e os teus olhos facilmente te denunciam.
O que foste lá fazer Diogo?

Perguntou-me o meu Pai com voz firme.

Senti-me confrangido.
Eu não tinha medo aos meus Pais, nunca foram esses os padrões de educação que me ministraram.
Respeito sim, medo não.
Eu sabia que era quase impossível enganar, e muito menos mentir a minha Mãe.
Fiquei imóvel e calado durante uns segundos.
E respondi.
Sim, eu efetivamente menti.
Não há trabalho nenhum, eu fui dar ao Rodrigo uma pastilha elástica que lhe tinha prometido hoje a tarde.
Já que não o fiz quando estava junto dele, porque vim a correr a quando da chamada da Mãe.

Ok, Diogo e porque não disseste a verdade?
Retorquiu-me o meu Pai.

Tive receio que por ser algo tão banal vocês não me deixassem ir.
Eu gosto de cumprir com a minha palavra e com as minhas promessas.
E o Rodrigo, é um caso duplamente especial, já que como vocês sabem é o meu melhor amigo, nunca me pede nada, e tem a conjuntura familiar que infelizmente todos sabemos.
Daí este meu empenho em nunca falhar com ele, porque sei que o magoo-o, e dessa forma estou, a contribuir para a sua tristeza e para o seu sofrimento.
Mas reconheço o meu erro em vos ter mentido.
Só me resta pedir-vos desculpa.
As lágrimas, rolavam-me pela cara.
De pé, encostado a parede, olhava os meus Pais, com o respeito que me merecem.
Sentia-me um ator, só e abandonado no palco.
De repente sinto uma mão, a puxar-me para um colo que bem conhecia.
O mais terno e doce colo do mundo. O da minha mãe.
Abraçou-me contra ela, limpou-me as lágrimas com a ponta do avental, e cobriu-me de beijos.
O meu Pai desviava o olhar para a televisão para eu não me aperceber de alguma lágrima atrevida que lhe fugisse., mas eu bem que o conhecia.
Ele era o meu Pai, mas acima de tudo o meu melhor amigo.
Sei do coração de ouro que tem, e do orgulho, que sente por mim.
Eu amo os meus Pais.
Depois de todo o afago da minha Mãe, levantei-me e fui pedir desculpa ao meu Pai.
Ele fitou-me fixamente, mas com um olhar ternurento, e disse-me.

Diogo, sabes que não gostamos de mentiras, mas o teu ato foi tão nobre, em honrares a tua palavra, e tu sabes o quanto o Pai admira isso, e acarinhares o teu melhor amigo, que só por si a falha, para connosco fica perdoada.
Orgulho-me muito de ti Meu Filho.

Então foi aí que os braços dele se esticaram e me envolveram no melhor abraço do universo.
Selou aquele momento com um beijo.

Sabes Diogo, tens razão se nos tivesses dito o motivo acho que não ia-mos entender.
Mas agora vendo a verdade e os motivos que te levaram a mentir, ensina-nos a ter-mos mais sensibilidade para pormenores que por vezes nós adultos não valorizamos.
Acabaste por nos dar uma boa lição Diogo.
Vai vestir o pijama lavar os dentinhos e vai-te deitar.

Agradeci-lhes, fui cumprir esse ritual, e meti-me na cama.
Agora já só faltava a ronda das despedidas.
Virem dar-me um beijinho.
Já estava aconchegado nos cobertores, e agarrado como sempre a minha Mantinha.
Já tinha uma boa história para lhe contar!

 
 
DIOGO MAR

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